21.7.05

#19

Eu encaro a fera. Ela me encara de volta. Aquela carinha sonsa, de quem não tem compromisso com a vida. Aqueles olhos... Shakespeare definiu uma vez que o ciúmes é uma besta de olhos verdes. Bem, esta tem olhos azuis. Ele faz o primeiro ataque -- se esfrega em minhas pernas e clama por minha atenção. Dou-lhe minha atenção já no pescoço. Pego-o de jeito, os pelos dele roçando em meu braço, macios como o carinho de mãe... Só que surgem unhas. Grandes unhas. Ele abraça meu antebraço com as garras, e finca-as fortemente. Solto o pescoço, mas logo os dentes dele se fincam em minha mão. O agarrado passa a me agarrar. E zomba de mim, como se tudo fosse uma brincadeira. Morde o meu dedo e chacoalha a cabeça. E ronrona. Como pode ronronar? Que bicho maldito. Rouba minha namorada, rouba meu ataque, rouba meu braço, e ronrona. Mas isso não vai ficar assim. Ataco a barriga dele com minha outra mão... Mas como é macio esse pelo. E ronrona mais alto. Já largou do meu braço, vira a barriga pra cima, e volta a se esfregar em mim. O vermelho do sangue toma conta do meu braço. Mostro para ela as marcas da batalha, e ela retruca mostrando as cicatrizes no próprio braço. Com orgulho, como se aquilo fosse um autógrafo do Ringo em plena Beatlemania. É, acho que essa luta eu perdi. Não há como lutar contra o monstro de olhos azuis. Ele é fofo demais para ser derrotado.

(originalmente cyber-publicado em 10 de maio de 2005)